sábado, 24 de julho de 2010

quarta-feira, 7 de julho de 2010

(26)HOJE ESCREVE “O COTA” – A história da “SOFIA”

Fotos nos Albuns do Berrinhos em :
“Fotos de gatos e cães adoptados com intervenção de minha dona”
E “SOFIA” -
link no título



I – A COLÓNIA

Nas traseiras do prédio onde viveram os meus sogros, em Almada, sempre existiram gatos vadios formando colónias que foram subsistindo por largos anos, graças ao apoio dos condóminos.
Os pais de minha mulher viviam no primeiro andar do lado esquerdo. Nas traseiras da casa, logo abaixo das janelas da marquise, existe um toldo que os “bichanos” utilizavam como passadiço para se aproximarem da habitação, pelo que eram literalmente alimentados “à mão”.


A passagem para o “refeitório”.

A maioria eram comensais “residentes” pois diariamente minha sogra (Maria do Rosário)encarregava-se de lhes proporcionar as refeições nos horários habituais. Também do terceiro andar e do mesmo lado esquerdo - depois de obtida a devida autorização para a utilização do espaço aéreo fronteiro às janelas… - se viam descer tabuleiros engenhosamente pendurados em cordéis que, três vezes ao dia, levavam as refeições - sólidos e líquidos - aos felinos que, assim, deixaram de se considerar vagabundos, muito menos totalmente abandonados e obviamente se apresentavam em boa forma física… por bem alimentados
Hora do “rancho”

I I – O “REFEITÓRIO”

No que concerne aos exclusivos comensais do nosso primeiro esquerdo, jamais foram autorizados a saltar para dentro de casa nem tão pouco alguma vez mostraram interesse em fazê-lo.
Interessante era que só muito raramente se assistia a lutas pelo direito de acesso às refeições. O espaço de tempo que normalmente mediava entre os fornecimentos do primeiro e do terceiro andares, foi dividindo o numeroso contingente de pensionistas que, talvez após um plenário, resolveram criar “turnos” saciando o apetite, à vez, sem guerras nem disputas.

A colónia no seu “habitat”

I I I – O GATO, ESSE ANIMAL INCOMPREENDIDO

Os anos foram passando e como a vida terrena é finita, chegou a hora em que a D. Mª do Rosário nos deixou para sempre. Foi em Outubro de 2005.
Seu marido, depois de algum tempo de recuperação, resolveu voltar para a sua casa. Tentámos, sem êxito, convencê-lo a ficar junto da família. Mas não foi possível demovê-lo.
Passou, então, a viver sozinho naquela casa que compartilhara tantos anos com a Mª. do Rosário, com a sua filha e mais tarde com os seus netos.
O Engº Iria já fora dono de um macaco, de algumas aves e de um cão que morreu atropelado. Por este último ficaram uma saudade imensa e um desgosto sentido e profundo. Jurou não mais adoptar outro animal. Relativamente aos gatos era o normal “suíço”… i.e. … neutral! Como todo o dono de cão (no seu caso ex… ) resvalava com frequência para uma opinião mais ou menos preconceituosa. Resumindo: não percebia nada de gatos. O mais perto que confraternizava com felinos e com bastante frequência, eram com os netos, leões mansinhos…
Dos de Alvalade! Adivinharam…!

Palavras para quê???
(espero que me perdoem…)


IV – GANHANDO “TERRENO” – a 1ª VICTÓRIA

O Iria, engenheiro de facto, reformado sentado no seu " maple" vendo televisão, foi um dia surpreendido pelo aparecimento improvável de um gato que sorrateiramente o espreitava a medo, à porta da sala.
Compartilhados que foram uns largos segundos de incredulidade, o Iria, talvez movido pelo silêncio da sua recente e desconhecida e ainda não totalmente aceite solidão, face àquela inesperada visita tentou estabelecer contacto, emitindo, o incontornável bishbishshshs
O bichano após um curto recuo medroso, aventurou-se.
O gato esquivo de anos de telhado entrou cautelosamente na sala. Parou, cheirou as sapatos, as calças do Iria e sentou-se à sua frente olhando-o fixamente. Aguardou pacientemente uma reacção: o grito para o fazer correr de volta ao telhado, o levantar abrupto, a atitude ameaçadora ou, finalmente a perseguição ao longo da casa em direcção à janela que inadvertidamente ficara aberta e permitira a invasão.
Passados minutos, mantendo-se o silêncio e de olhos nos olhos, ambos sentiram que algo estava a tomar corpo entre eles. Foi então, que jogando o tudo por tudo, o gato ganhou a coragem suficiente para saltar para o colo do Iria, deu-lhe duas marradinhas na mão e de imediato – não convinha abusar da “sorte” - foi sentar-se numa cadeira junto ao "maple" onde acabou adormecendo talvez embalado pelo ressono do Iria que entretanto também já adormecera
.


Sofia consegue dar “a volta” ao avô Iria

V – CONSOLIDANDO A VICTÓRIA


Estes recentes acontecimentos foram-nos relatado pelo Iria, poucos dias depois.
E para nossa surpresa passámos a saber que a janela das traseiras passara a ser diariamente aberta pelo meu sogro, depois de almoçar e antes de se preparar para a “sesta” no seu “maple” preferido.
Acto contínuo aparecia o gato que depois de uma espécie de cumprimento - a inevitável e carinhosa marradinha que passou a constituir um ritual - deitava-se ao lado dele e lá ficavam dormir, em mútua companhia.

Pela hora de jantar e sem que fosse para isso enxotado, o gato voltava à sua colónia no telhado sobranceiro à marquise só reaparecendo no dia seguinte à hora “do costume” caso o Iria não tivesse entretanto saído.
V I - AFINAL O GATO ... ERA UMA GATA!


Numa das nossas visitas ao Iria, chegámos à conclusão que o gato passara a ser um companheiro apreciado e importante para o meu sogro que já não conseguia desfrutar da sua “sesta” com satisfação, sem o ter a seu lado.
Ele agora fazia parte da sua vida.
Mitigava um pouco a solidão do avô Iria.
Nós em anteriores visitas já tínhamos referenciado o gato no meio da colónia.
Era sempre o último a comer, aguardando que todos os outros terminassem para então se dirigir à comida.
Mais tarde, depois de visto pela médica veterinária, compreendemos a razão da sua atitude.

V I I - BARBARIDADES
Tratando-se de um animal de “rua” a sua continuidade em partilhar o espaço com o Iria obrigava a que fosse levado à nossa Veterinária.
Soube-se, então, era uma fêmea, que teria mais ou menos 2 anos de nascida e que estava grávida há pouco tempo, o que ainda não era (também!!!) perceptível à vista.
Foi submetida à inevitável desparatização e a exames e análises rigorosas onde não lhe foi detectada qualquer doença que a inibisse de continuar a acompanhar o Iria.
Porém foi-lhe diagnosticada uma doença crónica, não contagiosa ou perigosa para humanos e animais, resultante dos efeitos das agressões brutais que lhe foram infligidas por “humanos” (??) e que eram bem visíveis, pelos lábios com cicatrizes, respiração difícil e a falta de todos os dentes o que explicava ter sempre a ponta da língua fora da boca dificultando a mastigação.
Depois de “aprovada” pela Clínica, voltou para a companhia do Iria e sendo altura de lhe ser dado um nome, maioritariamente os padrinhos votaram e “ficou” SOFIA!

Alguns dos efeitos das agressões de cobardes desconhecidos

O BI da Sofia (não chegou a ter o “Cartão Único”!)

V I I I – A MATERNIDADE
Em princípios de 2006 faleceu meu sogro. Foi juntar-se à sua companheira de uma vida, poucos meses após a morte dela.
A Sofia entretanto estava prestes a ter a sua ninhada. Apesar da distância, acompanhámos todo o processo, graças também ao apoio constante da D. Margarida, nossa amiga, mais que vizinha. A “tal”… do terceiro esquerdo. Todos os fins-de-semana íamos até Almada. A Sofia passou a ter acesso à nossa casa. E aproveitou-o bem. Após o parto, foi-nos aparecendo com os filhotes, um a um! Quatro! Três gatinhos e uma gatinha!
Preparámos então um espaço para ela, aproveitando um parapeito exterior por debaixo das janelas das traseiras. Colocámos uns tijolos para impedir que os gatinhos caíssem, providenciámos uma protecção que os abrigava dos raios solares e ficou à disposição da Sofia e da sua ninhada uma transportadora onde passaram as primeiras semanas pós-parto.
Até que – era fatal – todos passaram definitivamente para dentro de nossa casa, vivendo na marquise.Até que – era fatal – todos passaram definitivamente para dentro de nossa casa, vivendo na marquise.

O “abrigo” da parturiente

I X - A ADOPÇÃO DA “SOFIA”

A Sofia, com os seus “achaques” despertou em todos nós um enorme sentimento de solidariedade. Passou a ser medicada diariamente, situação que teria de ser para sempre, dada a sua doença crónica. Apesar dos seus problemas de saúde, era uma mãe extremosa. Amamentava as crias sem um queixume e mantinha-se permanentemente a seu lado.
E sobretudo tinha, na sua relação connosco um comportamento do mais meigo possível. Parecia, quando nos olhava, agradecer tudo o que tínhamos e estávamos fazendo por ela e pelos filhotes.
Desde que passara para o interior da nossa casa que aproveitava os momentos da “sesta” das crias, e ia dormir numa almofada que “destinou sua” ficando na nossa companhia. Silenciosa, passava despercebida excepto quando nas idas e vindas se roçava nas nossas pernas.

Tempo de “mama” – Sofia amamenta os quatro filhotes

No final do Verão de 2007, antes de voltarmos para Lisboa, a Manuela iniciou contactos para a adopção das crias da Sofia. Quanto a ela, não nos era possível abandoná-la e vê-la retornar ao telhado. Com a doença de que padecia, não duraria muito.
Fora decidido adoptá-la de "facto" e trazê-la connosco, para nossa casa, para junto do Berrinhos e da Maria, gozar o que lhe restava de vida, em paz e no sossego que nunca experimentara.

X - ADOPÇÃO DOS FILHOTES DA “SOFIA”
Acabado o período de amamentação, a Manuela já uma “expert” na difícil tarefa de encontrar um lar para gatos lançou-se , o tempo urgia, à sua agenda telefónica, ao mesmo tempo que enviava mails às carradas procurando adoptantes. O retrato da prole da Sofia foi amplamente divulgado em "poster" divulgado junto da Vet Mouras e nas montras de outros estabelecimentos nossos vizinhos.

"Poster" divulgado na "Net"
Aos poucos os bichanos foram adoptados. Todos os machos encontraram rapidamente famílias interessadas.
Um jovem casal adoptou um dos bichanos que “reservaram” ainda durante o período de amamentação.
De pelagem preta, patinhas, ventre e pescoço de um cor branco imaculado.
Passada a amamentação, foi recolhido pelos seus actuais donos que, para o efeito, se deslocaram desde Sintra até Almada. Passou a chamar-se PULGÃO! Vive bem tratado e tranquilamente no seio de uma família que o trata principescamente.
A espaços vamos recebendo notícias suas, acompanhadas de fotos dele e do amigo felino a quem foi fazer companhia: o TOM.
BECAS foi o nome do outro filhote que foi adoptado por uma jovem que respondeu a um dos apelos lançados. Vive em Camarate. Mantemos contactos com a sua adoptante. Sabemos assim que está bem, feliz e com mimos e comidinha a horas.
Ao terceiro macho chamaram-lhe Samuel – SAMU para os amigos – e vemo-lo com alguma frequência. Está quase totalmente branco exceptuando umas riscas cinzentas no rabo e umas sombras castanho/acinzentadas nas orelhas. Foi adoptado pelo JP, nosso filho. Vive em S. Domingos de Rana, dormindo e brincando com a Gabriela e a Tareca.

X I – PIMPINHA A FILHA DESAPARECIDA
E o quarto(a) filhote? Como fêmea, mais uma vez, tivemos dificuldades na sua adopção. As fêmeas são sempre difíceis de “colocar”. O preço da esterilização é considerado um escolho e a recuperação após a intervenção é um pouco mais demorada que nos machos. Necessitam, portanto, em início de vida, mais atenção. Concluindo: a única filha da Sofia, não aparecendo interessados na sua adopção, acabou (já estão a ver…!) por ficar em nossa casa, com a mãe. Foi-lhe dado o nome de PIMPINHA.
A Sofia foi uma companheira constante da sua filha. Passavam quase todo o tempo juntas. Raramente se separavam, mãe e filha.

Tudo coria às mil maravilhas, até que a Pimpinha desapareceu. Caiu da nossa varanda, de uma altura de três andares, e nunca mais foi vista.
Mãe (Sofia) e filha (Pimpinha) “passam pelas brazas“
X II - TEMOS “SAUDADES”… SOFIA!!!

A decisão de a esterilizar foi muito ponderada dado o seu estado de saúde. Porém, acabou por suportar muito bem a operação e convalesceu com uma rapidez que a todos surpreendeu.
Com a sua fraca saúde sempre vigiada, foi alvo de todos os possíveis cuidados da nossa parte e especialmente da nossa Clínica de sempre, a VETMOURAS. Só assim foi possível acompanhá-la e conseguir que sobrevivesse por mais dois anos até que faleceu em Abril de 2008.
Temos vívida a lembrança da sua calma e disponibilidade durante todos os tratamentos a que foi sujeita.
Operações, análises, toma de medicamentos, sucessivas idas e vindas na transportadora, ela tudo aguentou sem um “queixume” : sabem do que estou a falar!
Quem conhece verdadeiramente os gatos – quem os tem, quem os aceita como um ser que sente, enfim quem os trata como todo o ser vivo merece - é que entende como é possível um felino deixar-se manusear como a Sofia permitia. A sua atitude foi sempre a de se submeter inteiramente, como se tivesse a noção de estar a ser alvo de atenções que tinham como finalidade aliviar-lhe o sofrimento.

É muito difícil (mas mesmo muito difícil) lembrar-nos da Sofia sem que as lágrimas nos queiram rolar pelas faces.
Podem achar – e aceitamos todas as opiniões e críticas - todo este escrito estranho, deslocado, exagerado.
Temos a nossa consciência bem tranquila quando nos lembramos do que já passamos com os nossos mais próximos familiares e do que eles passaram…!
Convivendo diariamente com animais, mais tarde ou mais cedo, somos obrigados a considerá-los também como família.
Sofia continua na nossa casa, sem quaisquer mórbidas celebrações ou parolas e descabidas evocações, dentro de uma pequena urna onde repousam as suas cinzas.



cNeves

Caros amigos
Desculpem lá o “infindável “ discurso. Estava a ver que ele não mais parava de escrevinhar!
Finalmente farto das suas inúmeras (e chatas!) insistências, lá dei autorização ao velhote - meu dono - para escrever qualquer coisita no meu espaço, recomendando-lhe muito cuidado e que não me deixasse mal visto.
Não lhe dêem com muita força. Ele não precisa saber que é um “escritor” frustrado!
Para vós, uns miados envergonhados deste vosso criado,
Berrinhos.

PS: APENAS UMA LIGEIRA NOTA A FAVOR DO "ESCREVINHADOR"!
ELE QUIS PRESTAR UMA HOMENAGEM À DOCE SOFIA. EU NÃO SABIA DA INTENÇÃO E FIQUEI “LIXADO” DE NÃO TER SIDO EU A FAZÊ-LO.
MAS EMOCIONOU-ME! FOI BOM RECORDÁ-LA.
OBRIGADO Ó VELHO!